sexta-feira, 24 de agosto de 2012

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Tic, tac, o som dos badalos de tempo, de dobres, som imperceptível aos ouvidos durante a rotina, obsoleto som que invade o silencio.
Líquido quente revestido por membranas ondulam-se ao meu redor, a minha morada, alimenta-me das sobras, a soma é conduzida para a minha evolução, mas me sinto confinado, impotente, apesar da supérflua margem nula de conhecimento. São exatos 270 dias, nesta mórbida escuridão, ao longe escuto vozes, sons, movimentos e me sinto encarcerado, movimentos de expurgo, a surpresa é notória quando percebo que irei abrandar a escuridão. A membrana me expeliu, há uma luz, muitas pessoas a minha volta, muita claridade, mal consigo abrir os olhos, durante as piscadelas de “curio”, percebo duas esferas gigantes e brilhosas me observando, pálpebra saltitante, cor de melado, mel, sobrancelhas grossas, uma profunda ternura em seu brilho, aos poucos uma nova cavidade se faz, com estúpido brilho, o sorriso. Fico tenso com tanta informação, tanta luz, tanta desordem e quero voltar para o envoltório, mas as esferas me olham e me acalmam, respiro forte e vou me acostumando as novas cores.
Tracei caminhos, percorri estradas, me senti livre, conheci o desconhecido, as badaladas parecia não ter mais importância.
Em dias de sol respirava fundo e deixava com que minhas esferas se transbordassem de lágrimas, nos dias de chuva corria por entre as vielas e meio fio, a surfar com meus pés as corredeiras, fazia sempre barco de papel para carregar meus sonhos em alto mar. Mergulhava sem medo de me afogar, descia e subia por entre as quedas de água pura e quando o sol ou a chuva se despediam lá estava você a me contar sobre as nuvens, as águas e sempre com seus pequenos e ternurentos olhos.
A sensação que mais admiro é a da brisa, o vento que percorre todos os caminhos sem nada ser barrado, que balança seus cabelos e contorna arranha céus. O vento que faz do bambu e seda, ave, a ave que sempre me ensinara a ser, aquela que não necessita de grandes asas, mas apenas de ar e linha, a linha que me amarra aos deuses, como cordões umbilicais que lhe fazem pássaros sem voar, que seus olhos brilham e se tornam maiores e ferozes por vida
Passados os efêmeros e utópicos devaneios sempre há o fogo, aquele que arde e queima. Que destrói, que junto ao vento arrasa rastros em quilômetros de destruição, que bombardeia casebres, que deixa queimaduras, cicatrizes que são ainda dolorosas. Marcas do vestígio da fúria, do calor do que a de ser humano, racional e sem norte. É certo que onde há fogo, há água, nem que sejam as lágrimas da pequena esfera e de outras que se lamentam da destruição da chama, da ira ardente.   
Com tic, tac, não se brinca, pois lentamente se descobre que é senhor de tudo, trabalhando em milésimos, contribuindo para o amadurecimento de nosso espírito, só o tempo é capaz, de nos dar o ar, a água, o fogo e a terra para pisarmos firmes, traçarmos nossos caminhos e continuarmos, pois este mesmo tempo que nos dá, nos toma.
Ao menos posso fechar os olhos e me lembrar dos teus olhos pai!